(Des)caminhos do reconhecimento institucional da cidadania LGBTI+ no Brasil

03 de Novembro de 2023

Depois do susto, neste mês de outubro, com a Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara dos Deputados, que aprovou um projeto de lei que proíbe o casamento entre pessoas do mesmo sexo, seguimos refletindo sobre a precaridade da cidadania LGBTI+ em nosso país.

Afinal, como, depois de mais de uma década de um direito aparentemente bem assentado por decisão unânime do plenário do STF, reaparece essa rediscussão em âmbito legislativo? Será que teremos o fim desse direito? Ou mesmo de outros direitos LGBTI+?

 

Essa investida conservadora, mesmo que fadada a um fracasso mais imediato,  integra um conjunto de ofensivas conservadoras – para não dizer reacionárias – em curso no Brasil e em outras partes do mundo.

 

O objetivo delas tem sido revogar conquistas de liberdade sexual e de gênero, travar as novas possibilidades de reconhecimento de identidades e formas de vida, enfim, retroceder para uma imposição de uma ordem moral de inspiração não só religiosa, mas fundamentalista.

 

Pessoas LGBTI+ têm estado na linha de frente como alvo dessas mobilizações transnacionais da extrema direita global. As campanhas antitrans - e também antidrag - têm tido, por epicentro, os EUA. Somente em 2023, segundo o site Trans Legislation Tracker, foram propostas 583 medidas anti-trans, tendo 84 delas já sido aprovadas em diferentes estados norte-americanos. Aqui também estamos vendo campanhas no mesmo sentido, assumindo centralidade o debate em torno de crianças e adolescentes vivendo com variabilidade de gênero.

 

A despeito do cenário preocupante acima descrito, na política institucional, tivemos alguns acontecimentos de impacto, ainda que pontuais, em diversas partes do país. A eleição de duas deputadas federais trans, com votações expressivas, nos dois maiores colégios eleitorais, tiveram um efeito multiplicador nacional. Erika Hilton pelo PSOL de São Paulo, e Duda Salabert do PDT de Minas Gerais, com estilos diferentes, têm se destacado na atual legislatura na apresentação de propostas, discursos na tribuna, disputas parlamentares e nas redes sociais.

 

Na mesma linha, Dani Balbi do PCdoB do Rio de Janeiro, Linda Brasil do PSOL de Sergipe e Carolina Iara do PSOL de São Paulo são nomes de pessoas trans que têm se destacado nas Assembleias Legislativas estaduais. No governo federal, o mais alto cargo já criado para gestão de políticas LGBTI+, a Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, é ocupado pela travesti e ativista Symmy Larrat.

 

Essas lideranças que têm emergido com cada vez maior força na cena política, junto com o anúncio de ações afirmativas para pessoas trans em diversos certames públicos como o concurso unificado do governo federal e o da Defensoria Pública de São Paulo, indicam que os embates em torno da diversidade sexual e de gênero seguirão no centro das disputas políticas e morais da nossa sociedade. O resultado delas só o tempo poderá apontar, mas a certeza é a de que haverá – como sempre houve – muita luta e resistência.

Renan Quinalha

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